.

domingo, 28 de março de 2010

A Visão da Educação em Aristóteles



Qual a visão de Aristóteles quanto à educação?
Como podemos inferir, em sua amplitude, o entendimento aristotélico de uma Paidéia?
Sem desprezar as realidades e as paixões humanas, Aristóteles exprime aristocraticamente tanto sua ética como sua política. Sua filosofia, em conseqüência, demonstra-se razoável quando expõe, exemplarmente, o ideal grego da moderação numa moral possível de ser ensinada, embora não possa ser apreciada a rigor e em sua completude caso não seja acompanhada de uma respectiva prática. Em decorrência, tem-se, necessariamente, de reconhecer que, como resultado do contínuo desenvolvimento da atividade racional humana, o prêmio certo a ser conseguido é a felicidade correspondente à vida feliz (contemplativa) do filósofo (não, enquanto exclusão da ação, mas como a ação mesma, porém, em sua forma mais pura, no que o homem tem de mais divino em si mesmo, na pólis).

Em seu livro “Ética a Nicômacos”, Aristóteles inicia afirmando que “toda a arte e toda indagação, assim como toda ação e todo propósito, visam a algum bem (...)” e que “(...) o bem é aquilo a que todas as coisas visam”[1]. Mas os homens mais vulgares parecem identificar o bem, ou a felicidade, como o prazer. Porém, a felicidade, mais que qualquer outro bem, é escolhida sempre em função dela própria e não por algo mais. A felicidade é, assim, o fim a que visam as ações.

E se ação, ou atividade, pressupõe uma função determinada, qual a função própria do homem? Aristóteles responde dizendo que seria uma atividade da alma em conformidade com a excelência, por toda a vida, pois, como uma andorinha só não faz verão, também o exercício da razão por um curto lapso de tempo não faz um homem bem-aventurado e feliz.

Mas, para que possa haver o estabelecimento da felicidade, faz-se necessário aprender a ser feliz. E, como na arte, somente tocando-se cítara é que podem ser formados bons ou maus citaristas, é imprescindível a figura do professor a nos ensinar a gostar e a desgostar das coisas certas, como disse Platão, para que se realize a verdadeira educação.

Pois bem, sendo o homem, por natureza, incapaz de viver isolado, o bem do Estado é o mais perfeito, o mais belo, o mais divino. Sendo possível, mediante a reunião ou o agrupamento de indivíduos bem educados na realização de sua função específica, com aspiração a uma manifestação comunitária do que se conhece por felicidade verdadeira.

O Estagirita via na “pólis” não um simples fruto de convenção artificial, mas o real resultado de todo um empenho educativo ou formativo do homem, enquanto indivíduo, até os limites de projeção em seu aspecto coletivo.

Ademais, a felicidade da cidade depende da virtude no cerne de cada cidadão. E como cada homem pode se tornar virtuoso e bom? A esta indagação podemos inferir do contido nos escritos de Aristóteles que, em primeiro lugar, deve haver uma certa disposição natural, depois, sobre esta devem agir os hábitos e os costumes, em seguida os raciocínios e os discursos. Ora, a educação age sobre o hábito e o raciocínio sendo, portanto, um fator de enorme importância no Estado.

Então, para que possam obedecer (quando jovens) e comandar (quando maduros), os cidadãos deverão ser educados de modo fundamentalmente igual. O foco deverá ser a formação de homens bons, realizando o ideal estabelecido na ética, isto é, que o corpo viva em função da alma e que se manifeste o ideal da pura contemplação, sendo, no entanto, todos os demais que não sejam cidadãos, mas que morem na cidade, reduzidos a simples “condições necessárias” e condenados a uma vida subumana.

Para Aristóteles, seria o Estado e não a iniciativa privada, o provedor da educação, que haveria de iniciar pelos impulsos, pelos instintos e pelos apetites do corpo e, enfim, chegar à educação da alma racional, assumindo assim, a tradicional educação atlético-musical dos gregos.

Podemos ver, portanto, que Aristóteles vislumbrava nos limites da ciência política um instigante campo para reflexão sobre a educação. Isto porque a política passa a ser a aplicação da educação do próprio cidadão para a consecução das idéias éticas que possibilitam o advento da felicidade, tanto individual quanto coletiva. No fundo, a visão de política em Aristóteles era uma ampliação de sua visão de educação: saber bem administrar a função de atividade racional da alma (individual e coletivamente), quer seja numa organização democrática, oligárquica, republicana, monárquica ou qualquer outra que, contingencialmente, viesse a se consumar.


BIBLIOGRAFIA:


ARISTÓTELES. A Política (Livros I, VII e VIII). São Paulo: Martins Fontes, 2000.

_____________. Ética a Nicômacos (Livros I, II, VIII e X). Brasília: Editora UnB, 2000.


[1] ARISTÓTELES. Ética a Nicômacos (Livro I). Brasília: Editora UnB, 2000, p.17.

3 comentários:

Anônimo disse...

Grande Jorge Pi:

Você fez uma bela explanação a respeito da visão aristotélica da educação. Muito bem apropriada e articulada explicação. Já tinha lido antes a visão platônica da educação, onde o mesmo afirma que o processo de conhecimento tem sua origem na admiração do ser humano, ante as forças da natureza que o rodeia, em querer buscar o por quê de tudo (manancial, origem) e como ocorre esse processo de apreensão do homem ao objeto a ser conhecido. A abordagem aristotélica tem como motor do processo do conhecimento racional a busca da felicidade da pólis, estando esta alinhada a uma ação humana para atingir tal objetivo, que é o bem comum. Quanto a visão aristotélica de quem seria o provedor da educação, devemos entender e respeitar o momento histórico em que o mesmo estava inserido e sua visão limitada de mundo, pois não existia em sua época um Estado Totalitário em que séculos mais tarde veio a existir. Imagine uma educação exclusivista de um Estado Totalitário como existiu no Nazismo e Comunismo no século passado? Seria a negação da própria educação, pois estaria a mesma a serviço de uma peversa ideologia de Estado e não ao bem comum, que constitui no objetivo último a ser atingido pela educação. Ademais, a educação estará sempre a serviço de uma ideologia, seja de Estado, seja da iniciativa privada ou confessional-religiosa. Isto é um traço característico e marcante no fenômeno educacional.

Grande Jorge, continue a ser sempre aquela pessoa que sempre está a procura de algo maior, mais belo e nobre, e que não se conforma, como eu também, com as coisas banais da vida.

Fique com Deus.

Adilson.

Fernando disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Fernando disse...

Muito bom! É fundamental que mais questões como esta sejam abordadas. Educação é a base fundamental para o ser humano e a maneira como ela é explanada deve deve ter um alcance amplo para todos. E mais, a filosofia é fundamental, pois o fundamental é aquilo que faz pensar.
Nota-se que Aristóteles favorecia uma educação com base nas leis do governo, isto é, de responsabilidade estatal, onde o estado era o responsável pela formação ética e moral do ser humano, diferente de Platão que defendia uma formação mais espiritual do ser humano, e ainda era a favor de uma educação que ensinasse a coletividade, algo menos técnico e mais virtuoso.
Porém, Aristóteles defendia uma ideia social que eu creio ser ótima para qualquer época da vida do ser humano: "in medium virtus" a virtude está no meio-termo.
Parabéns pelo blog de vocês! Excelente!